Antonieta
Dias,
doutorada em Medicina
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“Ainda a propósito da prescrição por Denominação
Comum Internacional (DCI)/Liberdade de prescrição do médico, e liberdade de
opção do doente.”
“Receitas sem marca: nova lei já em vigor, mas
sem aplicação, Jornal de Notícias de 11.05.2012.”
“Estou à vontade para falar sobre este assunto, pois
devo ser das poucas profissionais que há mais ou menos 25 anos registou com
agrado, o aparecimento dos medicamentos genéricos.
Fui muito provavelmente das primeiras prescritoras, e
das mais incentivadoras para a sua utilização na nossa prática clínica.
Porém, não estaria na minha opção profissional de
livre escolha de prescrição, respeitando sempre a utilização da terapêutica mais
adequada para a patologia em causa, e mais económica para o doente e para o
Estado, que viesse a assistir a uma adulteração do papel do médico prescritor e
do doente “sofredor”, resultante da transformação de uma
política problemática e puramente economicista na saúde, que irá
necessariamente resultar a longo prazo num custo mais elevado na prestação dos
cuidados de saúde prestados aos pacientes.
Isto só não acontecerá, se deixarmos “morrer”
os doentes sem investir no seu tratamento. Apesar da Lei 11/2012 estar em
vigor, desde o dia seguinte à sua publicação, a sua aplicabilidade acabou por
ser inibida, por falta de regulamentação complementar.
Deixar ao doente a possibilidade de escolher o
medicamento mais barato, ou impedir o médico de prescrever o que considera mais
adequado ao tratamento do doente, é uma situação inédita, que desresponsabiliza
o médico, tendo em conta que, se não for respeitada a sua prescrição, não
poderá assumir uma terapêutica como sendo a eficaz, para o caso em apreço.
Recordo ainda, que não é por acaso que um
médico necessita de estudar seis anos para fazer a sua licenciatura, (no meu
tempo, havia dois anos de estágio obrigatório de medicina tutelada) e depois do
exame de acesso à especialidade, são necessários no mínimo mais quatro
anos de formação e no máximo mais seis anos, conforme a especialidade que
se escolhe.
Para além de ter de estudar diariamente para se
manter atualizado e para que a sua prática clinica seja executada de acordo com
a LEGIS ARTIS.
Permitam-me que faça referência apenas a dois
exemplos paradigmáticos da não conformidade e da não equivalência de alguns
medicamentos genéricos:
1.Furosemida (diurético), com a denominação comum de
Lasix®, cuja experiência clínica, tem décadas de utilização, em que se utilizarmos
um genérico (cuja biodisponibilidade e bioequivalência não é igual), o doente
não obtém resultados clínicos satisfatórios, o que permite concluir claramente
que não estamos a dar um medicamento equivalente, e como tal não estamos a
tratar o doente.
2.Zolpidem (indutor do sono), teoricamente igual ao
de marca, cujo nome comercial, não vou mencionar, porque existe mais do que uma
forma comercial, e não vou estar a fazer publicidade.
Com a utilização do genérico os doentes referem
que necessitam de tomar cinco ou seis comprimidos em vez de um só, que é o que
está preconizado em termos posológicos, porque não conseguem obter os mesmos
resultados terapêuticos, isto é não conseguem dormir.
Deixar ao doente a liberdade de escolher o mais
barato, pode corresponder a uma opção terapêutica de insucesso.
“O barato sempre saiu caro”, só que neste caso é a
vida de cada um que está em jogo, e que poderá corresponder a uma limitação da
sobrevida ou da qualidade de vida do utente.
Deixo como sugestão uma outra medida que seria mais
sensata e que traria mais benefício para o Estado, tendo em conta a sua grande
preocupação em economizar nos custos com a saúde dos portugueses.
Se o Estado comparticipasse apenas um medicamento de
cada classe terapêutica, permitiria manter a livre opção de prescrição do
médico e a liberdade de escolha do doente.
Com esta simples alteração, o Estado atingiria de
certeza os seus objetivos, sem correr o risco de comparticipar “um
placebo”, como se fosse uma fórmula galénica utilizada com fins terapêuticos.
É que ninguém acredita, por exemplo que se uma caixa
de sinvastatina de sessenta comprimidos, for vendida por um Euro e sessenta e
cinco cêntimos, possa conter a fórmula galénica adequada, para o tratamento.
Importa, ainda referir que é correto assumir a
insustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde, o que não é compreensível é
aceitar medidas que se podem tornar ineficazes.
Isso sim, é desperdício, nos custos com a saúde.
“
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