RAZÃO NO TEMPO CERTO
Continua a ser voz corrente de
que não há traços distintivos entre esquerda e direita. Morreram as diferenças
ideológicas. Nada mais falso. A aposta do PS na defesa de uma agenda para o
crescimento e o emprego é um exemplo disso.
Quando assumi o mandato de
secretário-geral do PS tivemos uma perceção clara de que a orientação dominante
em Portugal e na Europa fazia parte de uma corrente neoliberal, uma aposta
conservadora que valorizava o primado das finanças em desfavor das pessoas.
Numa linguagem mais acessível,
transformar as pessoas em números.
Anular o Estado social, a
partilha solidária de recursos, os mecanismos fomentadores de maior justiça
social e de promoção da igualdade de oportunidades. O primado era o dos mercados
financeiros. O objetivo era o fim de muitos valores e políticas associadas à
social-democracia, ao socialismo democrático.
Este era o pensamento dominante,
em julho passado. Não foi fácil introduzir uma outra perspetiva. Alguns
apóstolos do pensamento único tentaram mesmo ridicularizar a ideia de que havia
outro caminho e vaticinaram para o PS o papel de notário das políticas do atual
Governo. Enganaram-se!
Apesar destas dificuldades, o PS
persistiu na sua convicção e afirmou um caminho alternativo. Com muita clareza
afirmei que a prioridade deveria ser dada ao emprego e ao crescimento económico.
Isto é, a correção do nosso desequilíbrio orçamental deveria e deve ser feito
através da aposta no crescimento, pois só assim geraremos riqueza para pagar as
dívidas, preservar e criar empregos e reduzir, por via do aumento da receita, o
défice. Nunca escondi que se hoje fosse primeiro-ministro também teria de adotar
medidas de austeridade, mas nunca na dose e no ritmo que tem vindo a ser
aplicadas pelo atual Governo. Defendi e defendo uma austeridade inteligente que
saiba conciliar redução de despesa inútil com apoios ao crescimento e ao
emprego. Defendi, em finais de outubro, mais um ano, no mínimo, para a
consolidação das nossas contas públicas.
Mais tempo permite aliviar
sacrifícios das famílias e das empresas. Foi esta a nossa batalha em mais de
meio ano.
Em Portugal e em várias capitais
europeias, batalhei para que esta preocupação encontrasse eco nas instâncias
europeias e na minha família política.
Foi esse objetivo que me fez
reunir por duas vezes (outubro e na semana passada) com François Hollande. Vou
persistir com esse combate. Sempre tive a noção de que a resposta à crise exigia
e exige soluções nacionais e europeias.
E numa Europa dominada pelos
conservadores, é indispensável uma proposta política alternativa que só os
socialistas europeus estão em condições de protagonizar. Temos uma ideia federal
para a Europa, com um pensamento claro e uma estratégia bem definida.
Necessitamos de parceiros, em particular nos países com maior peso político
europeu. A influência de Portugal é reduzida, mas essa constatação nunca me fez
baixar os braços. Esta foi a nossa batalha. E continua a ser.
Mas já não estamos sós. Hoje,
esta preocupação é partilhada por muitos, europeus e portugueses. Tenho a
certeza de que faz parte de um largo consenso nacional. É uma bandeira que
ultrapassou o PS e é assumida por todos os que têm preocupações sociais, por
todos os que não se conformam com os valores recorde de desemprego em Portugal.
Apesar das nossas advertências, apesar das intervenções de outras organizações
de cariz social, religioso e socioprofissionais, o Governo e a maioria que o
apoia chumbaram iniciativas do PS e ignoraram todas as vozes que advogavam mais
atenção ao crescimento e ao emprego. Com desprezo e arrogância. Também com
convicção porque o que está a ser feito corresponde ao programa político do
atual Governo. Eles próprios o afirmaram, que não era necessário o memorando de
entendimento para desenvolverem esta política. Para o atual Governo o memorando
da troika é a sua política. A alternativa política que o PS está a desenvolver
assenta nesta diferenciação. Apostamos num outro caminho onde as pessoas estão
no centro das nossas preocupações. Uma política que permite manter a relação de
confiança entre o cidadão e o Estado.
Uma política que quer preservar
a Segurança Social e o acesso à educação e à saúde. Onde nenhuma pessoa fique
para trás. Uma política que visa conjugar as dificuldades do presente com a
salvaguarda de um património civilizacional inquestionável.
Este caminho está apenas no
princípio. Sei que temos muito para andar. Mas também sei que é um caminho que
recolhe cada vez mais confiança.
Só a mudança devolverá a
confiança e a esperança aos portugueses. A mudança da austeridade excessiva para
a agenda do emprego e do crescimento económico.
É esta agenda que melhor defende
o interesse de Portugal.
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