.

.

.

.

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Ainda o "património local entregue ao esquecimento"

Artigo de Opinião
Por: Antaeus

Ao contrário do que alguns dos nossos responsáveis pela cultura local pensam, a cultura é fundamental para a compreensão e história dos nossos valores.

A cultura é o conjunto de actividades e modos de agir, costumes e instruções de um povo, que de maneira alguma deve ser esquecido.
Em termos locais a nosso cultura não pode só estar voltada para a “Casa Museus dos Patudos” ou para a biografia do homem que deixou tudo para os pobres alpiarcenses, mas que na prática, pouco usufruem daquilo a que a eles foi destinado.
Os responsáveis pelo “pelouro da cultura” não devem andar constantemente de «olhos virados» para a obra do benemérito cuja formação cultural ficou bem marcada. Os responsáveis não devem usar a sua presença constante nos meios de informação para mostrarem a sua pessoa.
Devem estar nos bastidores a ver a obra que defendem e pretendem divulgar.
Cultura é também: a religião, a culinária, o mobiliário, as formas de habitação, os hábitos à mesa, as cerimónias, as artes, o desporto, os livros, a defesa do património, o lazer, a informação. Até saber falar e discutir politica é cultura.
O folclore, constituído por costumes, lendas, tradições e festas populares transmitidos por imitação é cultura. Ele transmite-nos o passado e o presente. É a cultura dos usos e costumes de uma localidade. Até o folclore em Alpiarça anda tão esquecido.
Ele, o folclore que já foi bem longe levando o nome de Alpiarça, anda agora no esquecimento quanto à divulgação. Lembro-me quando a costureira Adelaide descriminou na sua simplicidade, todo o sentido de cada dizer que consta no fardamento da dança.
Senti a emoção por todo um passado, mas de uma alegria estonteante, de saber que as gerações futuras saberão o que representam os trajes da nossa região. Mas com o passar dos anos vejo que nada daquilo que me alegrou tenha algum valor. Pouco ou nada se fala.
Alpiarça não é um concelho rico em monumentos históricos, mas tem alguns, que bem aproveitados e conservados poderiam levar o nome de “Alpiarça” bem longe e de forma a ser conhecido de uma outra maneira.
Não deixo de demonstrar na transcrição de um estudo levado a efeito pelos “Alunos da Escola José Relvas” cujo conteúdo deveria envergonhar quem toma conta da cultura local:
«… De entre as estações arqueológicas conhecidas realçam o “Cabeço da Bruxa” e o “Alto do Castelo” onde já foram efectuadas escavações científicas». Depois pode-se ler ainda: «..A Charneca de Alpiarça foi ao tempo Coutada Real de Caça. Na Ateia caçava-se então o javali, a raposa, a perdiz e o veado. Gil Vicente, na tragicomédia “Nau de Amores” representada em Lisboa em 1527, refere que Alpiarça pertencia ao mestre da Ordem Militar de Avis. Em Alpiarça esteve aquartelado aquando das invasões Francesas o jovem Alferes Bernardo de Sá Nogueira, mais tarde Marquês de Sá da Bandeira, enquanto Santarém se encontrava ocupada pelo exército de Massena. Anos passados, em 1846, levantando-se à voz de Manuel da Silva Passos, foi um das primeiras terras da Estremadura a aderir à revolta popular da Maria da Fonte. Mais conhecido por Passos Manuel, aquele vulto do liberalismo viveu na Quinta do Toco, tendo dedicado a Alpiarça uma particular atenção. Almeida Garrett, grande amigo de Manuel Passos, foi por este convidado e visitá-lo em Alpiarça.
Essencialmente agrícola, Alpiarça, é uma região vinhateira por excelência. São famosos os vinhos brancos que aqui se produzem. O melão, tomate, azeite, cortiça, batata, milho, trigo, morango, são também produtos da economia do Concelho».
O descrito faz parte de uma história passada que pouco ou nada, salvo as devidas excepções, tem beneficiado o concelho como muito menos a divulgação do existente como é o caso das estações arqueológicas.
Não passaram ainda muitos anos que os «seareiros» levavam meses fora de casa quando na época do melão. Nunca houve o cuidado de levar eventos que marcassem esta tradição bem alpiarcense acabando por ser divulgada por outros concelhos que pouco ou nada tem de ligação ao “melão”. O tempo passou a tradição das «feiras de melão» enraizaram-se noutros concelho.
Temos um “Vale d’Atela” praticamente abandonado e divulgado; um edifício da antiga Câmara, doado por um “Conselheiro de Estado” que aos poucos está a entrar na decadência, mesmo que ainda tenha algumas instalações em uso, como o “Posto da GNR”
Até as cúpulas que nele existiam já andam em caminhos e locais do “arco-da-velha”; Os azulejos que embelezavam o “Bebedouro” da Rua João Sousa Falcão” lhes deu algum destino desconhecido. Um local que deveria ser conservado porque ali se encontrava o povo alpiarcense quando da «ida-e-volta» da “jorna”; O “Moinho da Sartela” que qualquer dia está reduzido ao pó; a “Ponte Romana” que ligava Alpiarça ao Alentejo e outros mais.
É verdade que a nem só à autarquia compete divulgar porque lhe falta conhecimentos ou capacidades. As colectividades têm um papel ponderante mas torna-se impossível a estas desenvolver projectos sem o apoio dos eleitos que muitas vezes por troca de alguns votos e falta de conveniência politica, nega apoio a quem dele precisa.
Foi Gabriela Coutinho, então vereadora e responsável pelo “Pelouro da Cultura” que teve a iniciativa de criar uma “Agenda Cultural”. Durante alguns anos o seu grafismo e divulgação foram úteis. Por esta «meia-dúzia» de folhas em pequeno formato, sabíamos todo o movimento cultural, mas com o tempo alguma coisa mudou negativamente.
Até no desporto se falhou. Não se deu andamento à modalidade desportiva que estava a trazer anualmente centenas de forasteiros, quer para participarem quer para conviver. No auge da sua fama, tudo desmoronou.
Vive-se demais para uma coisa só. Não podemos abdicar de todo um passado em benefício da “Casa Museu dos Patudos. Não chega, temos que ter ideias para criar tradições anualmente, de maneira que levem o nome de Alpiarça bem longe.
Não é deixar ao abandono o pouco que temos. Conservar o património local não custa muito dinheiro. Talvez aquele que se gastou na construção dos trilhos em volta do “Miradouro dos Patudos” desse para sustentar durante alguns anos o pouco património local.
De maneira alguma se pode criticar esta zona envolvente mas já se pode dizer que neste momento todo este percurso de lazer está abandonado.
Pode o leitor interrogar-se sobre a justificação desta obra e os seus custos, como poderá se interrogar o leitor, se não houve o cuidado de mostrar “obra” quando agora se encontra quase esquecida?
Que nos interessa fazer obras quando nos esquecemos daquilo que faz parte de todo um passado histórico? A beleza de uma “Praia do Patacão” que se perdeu no tempo e hoje até repugna visitá-la; no “Parque do Carril” que parece uma “matagal”?
Até os chafarizes que existiam por várias artérias são memórias do passado e algo desconhecido para a juventude.
Poderia estar aqui a descriminar detalhadamente. Não me é permitido usar grandes espaços neste jornal. Mas ninguém me pode impedir de criticar no bom sentido que em Alpiarça não há sensibilidade cultural
Reconheço que é uma área muito específica. Requer muitos conhecimentos por causa da sua diversificação. Além do mais para recriar e publicitar os poucos locais históricos requer também uma grande imaginação. Precisamos de ouvir o povo e saber a sua opinião. Quanto a mim os responsáveis pela cultura, pouco ou ligam a estas coisas. São pessoas de “Gabinete” e só aquilo que eles fazem é que é bem feito. O que os outros dizem são «simplesmente idiotices». Falta-lhes a humildade para saber ouvir os outros e aceitar as criticas.
Orgulho-me como alpiarcense que sou de todo a património que a “Fundação José Relvas” nos oferece, quer social quer cultural, mas Alpiarça não é só esta zona. Há que divulgar e imaginar eventos para que os outros passem a ser lembrados e estejam à vista de todos.
Cada vez mais se divulga todo o património local. Até as “Feiras Medievais” são rotina; já há a “Feira do Chocolate”; “Feira do Gelado”, do “vinho, do chouriço e outras coisas mais.
Em Alpiarça, vive-se demais para a cultura erudita, para os convívios de catedráticos; para uma cultura de elevados conhecimentos que não se adequam ao ambiente em que estamos inseridos. Depois queixam-se de que a «presença de espectadores foi fraca». Que queriam? Que os agricultores fossem para o “campo” a ouvir música clássica ou falando nos tons vibratórios do piano?
Deve-se ter em conta o ambiente em que vivemos e a formação dos habitantes, sem esquecer aqueles que tem outra formação. Não chega fazer apenas um “”Feira Anual” ou a “Feira do Livro”. É preciso mais e não deixar acabar o pouco que existe. Até os “Contadores de Histórias” já mudaram de rumo. As coisas vão morrendo aos poucos.
É preciso reviver tudo aquilo que foi nosso; a nossa tradição para que esteja ao alcance do habitante e que este quando convida «alguém de fora» não o leve só à “Barragem” ou ao “Museu”. Até a zona da barragem parece que já deu o que tinha que dar. Começamos só a ver aquelas mães que trazem os seus meninos para que estes vejam os «patinhos».
Porque não fazer-se um “Museu do Tijolo” quando no passado tivemos no nosso concelho a maior industria de cerâmica e que trouxe dezenas de alentejanos para Alpiarça, enraizando-se estes no lugar do Casalinho; porque não arranjar um «rota turística» que leve as pessoas a visitar o sítio que «foi povoado há mais de quatro mil anos»; um local (“Cabeço da Bruxa” e “Alto do Castelo”) que dá para mil e uma imaginação; porque não fazer do “Moinho da Sartela” um local turístico com a discriminação da sua origem a tradições, de maneira a fazer que o visitante tenha que percorrer todo o interior da Vila.
Imaginem que se vai desenvolver a “Quinta do Touco” para fazer recordar quem nela viveu e o que continua a significar na história do nosso país; imagine-se; imaginem que numa tarde de Verão, podemos passear com os nossos amigos pelas margens da Vala assistindo a uma fantasiosa “Coutada” preparada pelos caçadores alpiarcenses, que deram o seu contributo para que o engendrado passe a ser um evento anual para todos os caçadores, onde, para além de se assistir à “coutada” nas proximidades existe todo um comércio dedicado à caça; imaginem fazer-se concursos nacionais na Vala de Alpiarça? Mas não como se encontra agora.
Até o “Parque de Campismo” está numa lástima quando poderia trazer centenas e centenas de visitantes para o concelho.
Às vezes penso que já ninguém quer saber destas coisas. Querem sim é aparecer em tudo que é comunicação social para lhes dar o “Status” da fama e do poder. Esquecem-se que este não é eterno mas o património local, este sim.
Não existe uma pequena lembrança para que os visitantes possam levar como recordação. Só levam vinho e melão quando o há. Para além da “Agenda Cultural” para os residentes por que não criar um «porta-chaves» com a miniatura de um melão ou algo do género. Da culinária tradicional, que tanta fama deu a Alpiarça. Sinto orgulho quando abro um livro de culinária e vejo receitas registadas como sendo do autor, quando na verdade é tipicamente alpiarcense.
Tivemos e temos pessoas com enormes capacidades. Apenas estão mal aproveitadas. Não digo quais para não ferir seja quem for.

Sem comentários: