Por: António Filipe, Deputado do PCP na Assembleia da República |
Já percebi que o som monocórdico dos comentadores do costume (ou da situação?) afina agora pelo diapasão de que na situação em que estamos não há discutir culpas e que, um pouco mais ou menos, todos somos culpados pela situação a que o país chegou.
Aqui, é preciso dizer: alto e pára o baile.
Que esses comentadores entre si se considerem culpados por ter embarcado todos estes anos no elogio acrítico das políticas que conduziram a esta situação, até aceito. Mas não é essa a ideia.
A ideia é considerar que a situação de crise a que o país chegou não resulta de opções e políticas concretas e deliberadas dos Governos PS, PSD e CDS, apoiadas pelos detentores do poder económico e pelo coro dos comentadores do costume, mas terá resultado de algum fenómeno natural imprevisível e inexplicável.
E sendo assim, não há que discutir culpas e todos nós portugueses, pelo simples facto de que aqui nascemos e aqui temos vivido, somos culpados das malfeitorias do PS, do PSD e do CDS e temos de arcar estoicamente e sem queixumes com as suas consequências.
Sucedem-se portanto os apelos à mais ampla unidade nacional e a um apoio incondicional ao Governo que há-de vir que, sabe-se de ciência certa, terá de continuar na senda dos anteriores.
Aqui, repito, alto e pára o baile.
Então aqueles que, como o PCP, têm contestado estas políticas e estas opções, e têm alertado sistematicamente para as suas consequências, também são culpados pelas consequências das políticas que sempre combateram?
Então aqueles que, como o PCP, foram insultados de tudo por se oporem ao rumo insensato desta, sublinho desta, integração europeia, também são culpados pela situação a que esse rumo nos conduziu?
Então aqueles que, como o PCP, foram chamados de anti-europeus e de coisas bem piores por alertarem para as consequências previsíveis da entrada no Euro de uma economia debilitada como a nossa, também são culpados pelos resultados a que essa entrada conduziu?
Então aqueles que, como o PCP, têm sido silenciados, tratados com desdém e até hostilizados por se oporem coerentemente a estas políticas que os comentadores do costume sempre incensaram, também são culpados pelas suas consequências?
É verdade que há culpados. Os governantes do PS, do PSD e do CDS são seguramente culpados, na exacta medida das suas responsabilidades governativas. Os comentadores que fazem profissão de apoiar acriticamente as políticas que têm desgovernado o país, também têm a sua quota de responsabilidade. E os eleitores que, ainda que enganados por cantos de sereia e embalados pela banda canora dos comentadores do costume, têm contribuído para manter PS, PSD e CDS invariavelmente no poder, também têm, objectivamente, a sua parte de responsabilidade. Mas quem sempre se opôs a essas políticas, também é responsável pelas consequências das políticas que sempre combateu?
O que agora se pretende com a teoria de que todos somos culpados é mais uma vez silenciar o facto de que esta política teve e tem opositores e tudo fazer para que, agora que em 5 de Junho se aproxima mais um momento da verdade, mais uma vez a culpa morra solteira.
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