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sexta-feira, 27 de março de 2015

Crise apagou 338 mil trabalhadores. Maioria ganhava até 600 euros

Nos últimos seis anos, mais de 330 mil trabalhadores por conta de outrem deixaram de constar das estatísticas de emprego do INE. A esmagadora maioria ganhava até 600 euros por mês. Explicação: o impacto da crise nos sectores de baixos salários, nomeadamente na construção, empurrou muita gente para a reforma ou para a emigração.
No final de 2014, Portugal tinha 3,611 milhões de trabalhadores por conta de outrem. São menos 338 mil (-8,57%) que no final de 2008, quando soaram os primeiros alarmes da crise financeira. Uma sangria sobretudo nos escalões mais baixos de rendimento: desapareceram 505 mil pessoas com salários de 310 a 600 euros. São agora pouco mais de 1,2 milhões, um terço de todos os trabalhadores por conta de outrem. Os escalões com salários mais altos contam até com mais trabalhadores, particularmente no grupo dos 1200 a 1800 euros - são mais 167 mil.
"Uma grande parte destas pessoas que desapareceu das estatísticas do emprego pura e simplesmente emigrou. Muitos jovens mas, principalmente, os trabalhadores da construção civil, tanto aqueles que trabalhavam diretamente no sector como os que trabalhavam em atividades afins, como imobiliário ou jardinagem" e tinham salários baixos, justifica Francisco Madelino, antigo presidente do IEFP. A maioria terá ido para Angola ou para o Brasil.
João Carlos Cerejeira da Silva partilha a mesma opinião. "O impacto da crise foi mais duro nos sectores de baixos salários, nomeadamente a construção civil, um sector marcado por muita informalidade em termos de salários, e que foi muito afetado", diz o professor da Universidade do Minho e especialista em política salarial.
A indústria, construção, energia e água contava, no final de 2014, com menos 362 mil trabalhadores do que em 2008. "Só nos últimos três anos emigraram 150 mil trabalhadores da construção, a maioria para países da Europa, mas também para o Canadá, Angola e Moçambique", explica o sindicalista Albano Ribeiro.
Outra razão para esta redução da força de trabalho é a passagem para a reforma dos trabalhadores com mais anos, normalmente com menos formação e salários mais baixos. "Há uma relação entre a estrutura etária, as qualificações e o rendimento salarial", garante Cerejeira da Silva. "Os indivíduos que passam para a reforma são, geralmente, pessoas de baixas qualificações e que receberam baixos salários", explica o professor.
A verdade é que, dos quase 5 milhões de indivíduos com 45 ou mais anos que o INE contabiliza, só 475 mil têm o ensino secundário completo e quase dois milhões têm o primeiro ciclo do ensino básico completo.
Começa, ainda assim, a notar-se uma recuperação do emprego. De 2013 para 2014, o número de trabalhadores por conta de outra aumentou em 700 mil indivíduos, ultrapassando 3,6 milhões. É de esperar que esta tendência se mantenha? "Se, sendo muito otimista, o crescimento económico chegar aos 2%, é de prever que haja, este ano, alguma recuperação no emprego, mas ligeira, com novos contratos feitos com níveis salariais inferiores aos salários médios praticados no mercado", prevê o professor da Universidade do Minho, acrescentando que "as regras de despedimento mais flexíveis poderão também incentivar as empresas a fazerem contratações".
Desde a chegada da troika a Portugal, em 2011, que o rendimento mensal líquido se mantém praticamente inalterado. O ano passado não foi exceção: o salário médio fixou-se nos 813 euros, valor muito próximo dos 808 euros registados em 2011. Os serviços apresentam a média salarial mais elevada, com 842 euros, seguindo-se a indústria e construção, com 751 euros. Muito abaixo fica a agricultura, com uma média salarial de 578 euros.
A diferença salarial entre homens e mulheres também pouco mudou. Desempenhando funções idênticas e da mesma responsabilidade, com qualificações semelhantes, as mulheres ainda ganham menos 20,4% do que os homens em Portugal. Ou seja, se um homem receber, por exemplo, 700 euros, uma mulher no mesmo cargo receberá 557 euros.
«DV»

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