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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Segredos de Estado em Portugal sem controlo político há 16 anos

Os documentos classificados em Portugal podem sê-lo para sempre. Um veto bloqueou uma comissão de fiscalização. Ninguém retomou a ideia
A aplicação da Lei do Segredo de Estado está desde que existe (1994) sem qualquer controlo e na última legislatura a tentativa que houve para pôr a funcionar um sistema de fiscalização esbarrou num veto político do Presidente da República.
A iniciativa legislativa vetada pelo Presidente da República caducou com o fim da legislatura e na actual ninguém mostrou vontade de retomar o processo. "Tenho tido outros assuntos entre mãos", disse ao DN Mota Amaral (PSD), um dos co-autores do projecto de lei vetado. O outro, Vitalino Canas , do PS, argumentou de forma semelhante ("têm surgido outras coisas mais prioritárias"), embora acrescentando que quando a situação política "acalmar" o assunto deve ser retomado - e numa lógica de acolhimento às reservas presidenciais.
A ausência de uma comissão de fiscalização significa algo muito simples: ninguém "zela" pelo "cumprimento das suas disposições" - e o mesmo é dizer que ninguém verifica se os "carimbos" da classificação de documentos estão a ser bem utilizados ou não; ninguém desclassifica documentos (mesmo que a classificação tenha perdido sentido); e ninguém "aprecia" as "queixas que lhe sejam dirigidas sobre dificuldades ou recusa no acesso a documentos e registos classificados como segredo de Estado" - documentos como os que, agora, a WikiLeaks está a divulgar por todo o mundo.
A composição da comissão de fiscalização prevista em 1994 seria presidida por um juiz indicado pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, integrando ainda dois deputados, um nomeado pelo "maior partido que apoia o Governo" e outro pelo "maior partido da oposição".
No processo legislativo de 2009, a presidência do órgão mudaria, passando a ser presidida pelo presidente da AR, o qual passaria a ter acesso sem "qualquer restrição" a documentos classificados (poder que hoje só está ao dispor do presidente e do primeiro-ministro).
A comissão de fiscalização teria a incumbência de "organizar e manter actualizado um registo de todas as informações e dos documentos classificados como segredo de Estado."
Em Julho de 2009, Cavaco Silva vetou a lei por conter "soluções normativas que, numa matéria tão sensível como esta, afectavam o equilíbrio que deve existir entre os poderes do Estado". Isto porque atribuía "a um órgão interno da Assembleia da República - que, para mais, deixaria de se configurar como um órgão independente - amplas faculdades na gestão das matérias classificadas como segredo de Estado, permitindo-lhe proceder oficiosamente à desclassificação de documentos que haviam sido classificados por titulares de outros órgãos de soberania". "Ficaria aquela comissão investida de competências que, no limite, poderiam afectar actividades de tal importância como sejam o comando supremo das Forças Armadas ou a condução da política internacional", considerou o PR, denunciando ainda "riscos para a própria salvaguarda do segredo de Estado e para os superiores interesses nacionais que o mesmo visa preservar", disse o Presidente.
«Diário de Noticias»

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