A contratação de médicos pagos à hora através de uma empresa de trabalho temporário não está a resolver as graves deficiências de assistência à população no Centro de Saúde de Benavente, uma promessa feita pela própria ministra Ana Jorge ao presidente da autarquia, António José Ganhão.
No Serviço de Atendimento Permanente (SAP), há mesmo queixas de um clínico que adormeceu várias vezes em frente aos pacientes, durante as consultas.
A situação foi confirmada ao nosso jornal pelo coordenador da Comissão de Utentes do Concelho de Benavente (CUCB), Domingos David, que diz ter “relatos de várias testemunhas que o presenciaram”, um caso insólito que é do conhecimento do pessoal de enfermagem e dos funcionários do centro.
“Uma das vezes deu-se com uma senhora que é membro da comissão, na presença do marido e o filho”, lamentou o responsável, que denuncia a ocorrência de outras situações muito graves no funcionamento do SAP.
A Comissão de Utentes do Concelho de Benavente alerta que há cerca de 9 mil utentes sem médico de família no concelho
Segundo Domingos David, os problemas têm origem no facto dos clínicos que asseguram o funcionamento diurno do SAP chegarem para trabalhar sem descansar de turnos cumpridos noutros hospitais.
“É impossível um médico sair às 8 horas da manhã do Barreiro ou de Évora e entrar em Benavente às 8 horas”, afirma, sublinhando que “além do cansaço dos médicos ser enorme, a qualidade do serviço sai prejudicada”.
Os clínicos “chegam atrasados e ainda vão tomar o pequeno-almoço antes de começar a dar consultas, o que muitas vezes só ocorre depois das 10 horas. É óbvio que isso motiva muitas queixas dos utentes”, sublinha.
Além dos atrasos, já houve dias em que nenhum profissional apareceu para assegurar o funcionamento do SAP (25 e 27 de Outubro), o que Domingos David considera “escandaloso”.
“Estas empresas de trabalho temporário têm que ser fiscalizadas, no que se refere à qualidade do serviço que prestam às populações”, exige Leonor Parracho, presidente da Junta de Freguesia de Benavente, sublinhando que esta é uma solução “que até sai mais cara ao Estado e aos contribuintes”.
A presidente da Junta de Freguesia, Leonor Parracho, exige uma maior fiscalização ao serviço prestado pelas empresas de colocação de médicos
“Não vale a pena mudar de empresa, porque pertencem todas ao mesmo grupo e os médicos são sempre os mesmos”, explica a autarca e membro da comissão de utentes, para quem a contratação de profissionais à hora para o SAP nunca vai resolver o problema de fundo, que é a falta de médicos de família no centro de saúde de Benavente.
O concelho de Benavente, com uma população que ronda os 30 mil habitantes, tem neste momento cerca de 9 mil utentes sem médico de família, cuja única alternativa é recorrer ao SAP.
Luísa Portugal, directora do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) da Lezíria – a que pertence o centro de saúde de Benavente – confirmou ao nosso jornal que existe uma queixa no Livro Amarelo por causa do adormecimento do médico, e diz estar a realizar “reunião periódicas com a empresa para resolver este e outros problemas”.
A directora explica que “a falta de profissionais para estes serviços agravou-se desde a entrada em vigor da lei que proíbe a contratação de médicos já reformados”, e sublinha que a maioria das queixas relaciona-se “com atrasos e tempos de espera demasiado longos”, não existindo para já reclamações “por negligência ou má qualidade dos actos médicos”.
Em termos globais, a responsável não esconde que a situação é “complicada”, mas “dada a escassez de médicos, esta solução é a única que temos para garantir a prestação de cuidados de saúde aos utentes de Benavente”.
“Faltam 18 a 20 médicos para garantir um atendimento regular na área de acção do ACES Lezíria, onde existem cerca de 30 mil utentes sem médico de família”, explica Luísa Portugal, dando conta que há problemas de assistência em todos os concelhos, à excepção de Alpiarça.
“No próximo ano, a tendência é para piorar”, antevê a directora, dando como exemplo o caso de Salvaterra de Magos, onde dois clínicos se vão reformar em 2011 e há já cerca de 7 mil habitantes sem médico de família.
«O Ribatejo»
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