Por: Anabela Melão
Já vos falei da minha consternação perante o estado em que encontrei a terra dos maus pais e avós, Vale de Cavalos, a que não ía há muito tempo – desde a morte do meu avô – porque sempre senti que apenas “se vai à terra” quando por lá ainda temos quatro paredes para nos albergar o corpo e animar a alma. Recentemente, tentando encurtar o espaço entre construir uma casinha em homenagem ao meu querido avô, decidi procurar uma casa para arrendar, no intuito de, entretanto, ir recriando laços e reconstituindo afectos. A desolação não podia ter sido mais devastadora.
Numa terra em que não há centros de postos de trabalho, a juventude sai e faz da terra um dormitório, os mais velhos envelhecem com a tristeza de ver os filhos partir, e a terra parece quase uma aldeia fantasma.
Impotente, saí de lá a pensar o que poderia ser feito, a curto, médio e longo prazo.
A curto prazo ressuscitei os afectos entretanto esvanecidos e procurei dar a mão aos jovens sem emprego e sem perspectivas de ali se fixarem. É preciso formar gente nova capaz de reinventar soluções sociais, económicas e políticas. E isso passa por lhes incrementar o sentido de cidadania e por lhes despertar o instinto de intervenção político, aproveitando ao que se apresentem com “veia” para esse papel. E por lhes abrir os horizontes e por os integrar nos centros de decisão que, infelizmente, estão nas grandes cidades.
A médio prazo, há que captar investidores e de, sob contrapartidas, sejam elas benefícios fiscais, juros bonificados para a implementação de infraestruturas e equipamentos ou subsídios de primeiro emprego, lhes aguçar o apetite para instalar pólos empresariais que revitalizem a terra e lhe dêem a alma que foi perdendo. Quem está ou tem contactos com potenciais investidores tem de começar um trabalho pioneiro captando centros de trabalho capazes de empregar famílias e de lhes dar estabilidade e de os “agarrar” à terra. A começar pelo turismo rural que oferece um verde incomparável e a magia do cheiro a terra sem igual.
A longo prazo, a interioridade não pode continuar a ser um factor de isolamento, muito menos neste caso, em que o Tejo é uma porta para Lisboa. Alarguem-se os horizontes territoriais para lá dos subúrbios urbanos e reinvista-se a partir das pequenas cidades. Lisboa não é Portugal e o Ribatejo tem um potencial que não pode ser desprezado. Politicamente, esta é uma contestação que tem de começar já e de se estender até se alcançarem os objectivos de revitalizar a terra e de dar esperança aos jovens.
Vim triste, mas não baixei os braços. Nem os baixarei nunca. Adoro o cheiro bravio daquela terra e revejo-me na força e resistência daquelas gentes. E deixo um grito: esteja-se por lá ou esteja-se por cá, vamos dar as mãos e ressuscitar o Ribatejo. Ninguém é de Lisboa, porque Lisboa não é uma “terra”. Quem nasceu em Lisboa “é de vaso”. Eu amo a “minha terra”, a dos meus pais e dos meus avós. E não baixarei os braços vendo-a morrer lentamente. Vou lutar com todas as minhas forças para que a “velha” Alpiarça recupere o brilho e para que Chamusca continue a revelar-se como a “estrela” que se tem mostrado, na cultura e na sociedade, e Vale de Cavalos há-de reerguer-se entre as cinzas e – qual Fénix - voltar a abraçar os seus filhos, a dar-lhes esperança, em suma, a devolver o brilhos nos olhos das crianças, a serenidade nos olhos dos jovens, e a felicidade aos olhos dos velhos que, assim, terão por perto, o afecto dos filhos e dos netos.
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