Declaração Política Deputado António Filipe (foto) Sessão Plenária de 08/03/2012
Contrapartidas da LPM Senhora Presidente, Senhores Deputados, Na última década o
país fez um avultado investimento em equipamentos militares. Alguns de
inestimável utilidade, como os helicópteros de busca e salvamento ou os navios
patrulha oceânicos, outros de prioridade contestável e contestada, como os
submarinos ou os blindados do Exército, outros de manifesta inutilidade, como os
caças F-16 que nunca saíram dos caixotes. Seja como for, a Lei de Programação
Militar proposta e aprovada em 2003 pelo Ministro Paulo Portas inscreveu um
investimento de 5340 milhões de euros de equipamentos militares, verbas que,
todos reconhecerão, ficavam muito, muito, acima das nossas possibilidades. Os
compromissos então assumidos na Lei de Programação Militar, alguns deles em
contratos de leasing gravemente onerosos, como é o caso dos submarinos,
representam uma factura muito pesada a pagar em duas décadas pelo povo
português, ao ponto de, na situação de crise financeira em que nos encontramos,
todas as verbas disponíveis da Lei de Programação Militar sejam gastas no
cumprimento dos compromissos financeiros então assumidos. No entanto, o país
teria muito a beneficiar com tais aquisições porque existiriam fantásticas
contrapartidas para a economia nacional. As empresas multinacionais
norte-americanas e europeias que nos forneceriam aviões, submarinos,
helicópteros, viaturas blindadas e outros equipamentos, obrigavam-se a prestar
ao Estado Português um conjunto de acções contratualmente determinadas – as
contrapartidas – susceptíveis de produzir efeitos positivos relevantes na
economia portuguesa, que contabilizados, deveriam perfazer um montante não
inferior ao montante da aquisição. Um montante que o Presidente da Comissão de
Contrapartidas de então, Pedro Brandão Rodrigues, qualificava, em reunião da
Comissão de Defesa Nacional, como equivalente ao Quadro Comunitário de Apoio.
Pois bem: passados quase 10 anos, 3 Governos e 3 Comissões de Contrapartidas, a
diferença entre as contrapartidas prometidas e contratualizadas e as
contrapartidas efectivamente realizadas é francamente desolador, ou para ser
mais claro, catastrófico. O último relatório elaborado pela extinta Comissão
Permanente de Contrapartidas, relativo a 2010, é muito elucidativo. Senão
vejamos: • Helicópteros EH-101: Contrapartidas aprovadas em Março de 2005 no
montante de 403 milhões de euros. Incluía 34 projectos. 20 nunca arrancaram. Até
ao final de 2010 estavam cumpridas 29,8 %, no montante de 100, 5 milhões de
euros. Em caso de incumprimento, as penalidades deveriam ter sido accionadas em
Setembro de 2011. Foram accionadas? Que se saiba, não! • Submarinos:
Contrapartidas no valor de 1.210 milhões de euros. Contrato assinado em Outubro
de 2004 para um período de 8 anos. Seis anos passados, 19 dos 39 projectos não
tiveram qualquer movimento. O grau de cumprimento foi da ordem dos 31,55 %, ou
seja, 381,92 milhões de euros. O processo complicou-se com graves diferendos na
aplicação dos contratos, com crimes de burla qualificada e falsificação de
documentos. Quadros da empresa alemã foram condenados por crimes de corrupção
cometidos neste processo, na Alemanha, já que em Portugal, nem corruptos, nem
contrapartidas. A empresa alemã recusa-se reiteradamente a cumprir as suas
obrigações e a indemnização fixada contratualmente para o Estado Português em
caso de incumprimento é de 10% do valor contratado. Como é evidente: o
incumprimento compensa e outros crimes, até prova em contrário, também
compensam. • Viaturas blindadas de rodas: Contrato assinado em 2005 para um
período de 9 anos. Montante: 516 milhões de euros. Cumpridos 11,4 %, no montante
de 58,8 milhões de euros. O contrato com a empresa alemã Steyr, entretanto
adquirida pela Norte-Americana General Dinamics, incluía o fabrico das viaturas
em Portugal pela Fabrequipa, e a transferência de tecnologia que permitisse a
esta empresa nacional fabricar idênticas viaturas para outros mercados. Nada se
concretizou e o diferendo instalou-se entre o consórcio e a empresa nacional,
cuja viabilidade futura está seriamente comprometida por esse incumprimento. O
que faz entretanto o Governo? Que se saiba, nada! • Aquisição de torpedos: valor
das contrapartidas, 46,5 milhões de euros pelo período de 9 anos. Dos 9
projectos apenas avançaram 3. Os outros 6, não avançaram nem têm perspectivas de
avançar. Esperava-se uma definição no primeiro semestre de 2011. Até hoje, que
se saiba, nada! • Modernização dos F-16: Contrapartidas no valor de 174,9
milhões de euros, assumidas em Fevereiro de 2006. Foi o único contrato
integralmente cumprido, com grande benefício para a OGMA. • Aviões C-295:
Contrapartidas no valor de 460 milhões de euros. Contrato assinado em 2006 para
um período de 7 anos. O grau de cumprimento é de 0,9%, no montante de 4,12
milhões de euros. Esperava-se uma evolução para o primeiro semestre de 2011.
Aconteceu alguma coisa? Que se saiba, nada! • Modernização dos aviões P3 Orion:
Assinado em Setembro de 2007, no montante de 99,7 milhões de euros. Cumpridos
29,9% no montante de 29,8 milhões de euros. • Aquisição de targeting pods para
os F-16: Contrato assinado em Novembro de 2008, no valor de 32 milhões de euros.
Cumprimento até hoje: Zero. Resumindo e concluindo: de contrapartidas no valor
global de 3021 milhões de euros, foram cumpridos contratos no valor de 799
milhões, o que corresponde a 26,4% do contratado. As empresas que nos venderam
centenas de milhões de euros de equipamentos militares que os portugueses estão
a pagar com os sacrifícios que sabemos, lesaram o Estado Português em mais de
2200 milhões de euros de promessas contratualmente assumidas, que não cumpriram.
O Estado Português celebrou contratos que não salvaguardam minimamente a sua
posição e tem-se revelado incapaz de fazer cumprir os contratos que assinou.
Quanto ao actual Governo, resolveu o problema de uma forma radical: extinguiu a
Comissão de Contrapartidas; passou a gestão das contrapartidas do Ministério da
Defesa para o Ministério da Economia; o Ministro da Economia, questionado sobre
as contrapartidas, nem sequer sabe do que se trata; e o Ministro Paulo Portas,
responsável pela maior parte destes contratos, passeia a diplomacia económica
pelo mundo em voos tão altos que já nem consegue ver os problemas de quem vive
cá em baixo. Senhora Presidente, Senhores Deputados, Não é suportável que o
nosso país esteja a ser lesado em mais de 2.000 milhões de euros e que o Governo
manifeste perante este escândalo a mais absoluta indiferença. O Governo tem de
explicar ao país o que está a fazer, e o que tenciona fazer, para recuperar as
contrapartidas que nos foram prometidas e para accionar os incumpridores e os
portugueses não podem deixar de tirar ilacções acerca dos Governos e dos
governantes que, por acção e por omissão, conduziram a esta situação
inconcebível. O que exigimos de imediato é que, extinta que foi a Comissão de
Contrapartidas, o Governo informe esta Assembleia, com rigor, acerca da situação
actual das contrapartidas e das diligências que estão a ser feitas para garantir
o seu cumprimento. É o mínimo que se exige desde já, em nome da mais elementar
decência e de um mínimo de respeito para com os portugueses.
NR: Esta "Declaração" foi enviada ao "Jornal Alpiarcense"pelo Deputado do PCP, António Filipe
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