Artigo de Opinião
Por: Anabela Melão
Passos Coelho parecia apostado em romper com a postura típica de animosidade pessoal que opunha Ferreira Leite a José Sócrates e em manter uma ‘atitude de Estado’ na sua relação com o chefe do Governo. Surgiu como que erguido de Alcácer Quibir, resolvido a fazer a diferença. Em contraste à pose tão criticada de José Sócrates, dita de arrogância, autoritarismo e infalibilidade, opôs um perfil pacífico, brando e dialogante. Uma “postura” adaptada ao perfil de primeiro-ministro alternativo.
Mas, como já dizia O Líder “quem não está comigo está contra mim” e era previsível que esta duplicidade não se pudesse prolongar ad eternum. Apostar, de uma banda, na colaboração institucional com Sócrates, e, de outra, na recusa de reeditar o Bloco Central ou de participar num qualquer Governo de Salvação Nacional, fragilizou e apequenou a margem de manobra de Passos Coelho.
Primeiro, e desde logo, terá esquecido que o PSD foi sempre um partido de lutas intestinais – mesmo quando Cavaco os calava pelo temor reverencial.
Depois, quis aproveitar a maré de populismo já iniciada a (des)propósito das presidenciais, mas percebeu a conveniência de não se “colar” ostensivamente a Cavaco Silva, precisamente pelo tal perfil que faz questão em manter – e que é mais diferente do de Cavaco do que do de José Sócrates.
O certo é que a crise nacional acabou por ser madrasta para Pedro Passos Coelho, furando-lhe os timings da sua estratégia – admite-se bem planeada e arquitectada – e acabou por revelar de forma prematura as suas fragilidades.
Não saiu ileso do episódio das SCUT: as concessões tiradas à força a Sócrates valeram-lhe o reincendiar de velhos conflitos com alguns barões autárquicos do partido (sobretudo no Algarve).
As declarações do seu braço direito, Miguel Relvas, sobre a aliança com o CDS ou o veto do Governo à venda da Vivo à Telefónica, evidenciaram que “casa onde não há pão…”, ou seja, a incongruência das posições internas do PSD.
Segundo, a intenção – que se queria messiânica – de reunir assembleias de notáveis para rever a Constituição e reformar o programa do partido – num caso, pondo à testa um destacado militante monárquico, noutro, reunindo personalidades ‘independentes’, algumas com passadas e conhecidas ligações ao PS – pareceram golpes – não de asa – mas de oportunidade política, a tentar igualar os que o PSD tanto aponta ao socratismo.
A duplicidade de Passos Coelho pôs a descoberto a displicência e o novo-riquismo liberal de que o PSD sempre fez apanágio e serviu, não somente, mas designadamente, para “nos pôr a pau” sobre o seu suposto ‘sentido de Estado’.
Porque Pedro Passos Coelho parece estar a tomar atitudes sem sentido e porque começamos a pensar que nem faz ideia do que será essa máquina brutal que é o Estado.
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