Por: Anabela Melão
O português é um povo dado a baixa confiança, ao saudosismo, e, ultimamente ao pessimismo.
Se quisermos encontrar uma causa, é o que não nos falta. Desde logo, a começar pela falta de perspectiva.
As pessoas gabam-se hoje de não poder passar recibos verdes em seu nome ou facturas em nome das suas empresas, ou porque estão a receber o subsídio de desemprego ou porque declararam falência. Ainda há uns tempos atrás, uma e outra circunstância envergonhava quem se encontrava nessa situação, e movidos pelo ostracismo social a que tais estatutos os devotavam, essas realidades eram dissimuladas para o exterior. Mais do que haver falta de fiscalização – e obviamente que a há – a falta de vergonha na cara foi uma qualidade que passou de normal a rara, passando até por estranho quem não beneficia destes subsídios podendo fazê-lo quando o chico-esperto do vizinho que vive num andar de luxo, em regime de comodato – a misericórdia de um amigo … - ostenta um carro de luxo – por acaso, de um seu familiar que lho cedeu por compreensão e solidariedade… e por aí fora.
Por outro lado, há os que vivem dos cartões de créditos e dos empréstimos pessoais que não pagam mas que lhes permitem manter-se e ser aceites pelos seus compadres que fizeram do calote uma engenharia financeira caseira, e a que, mais uma vez, só não recorrem … os tolos.
Há ainda os que reconhecem que o ex-funcionalismo público perdeu as poucas conveniências que proporcionava a quem nele se integrava, como o pleno emprego, tema passar ao regime de mobilidade, tenha consciência de que pode ver tomados, sob a forma de empréstimos forçados, as remunerações suplementares, de férias ou o décimo quarto mês, saiba que não tem qualquer hipótese de ser promovido na próxima década, e não invista em, tendo a formação e a oportunidade, partir para o seu próprio negócio, eventualmente aproveitando algum do know-how adquirido enquanto funcionário público, apesar de os ex-ministros e os ex-gestores públicos nos darem exemplos copiosos de como isso se faz e de como se pode rentabilizar tais mais-valias.
Outros conhecem a má situação económica das empresas em que laboram, que ameaçam fechar, mas nem sequer equacionam, nos casos em que tal seja possível, partir para o empreendorismo, muitas vezes, por inabilidade em recorrer aos apoios nacionais e comunitários em que os falsos pobres são tão hábeis a recorrer.
Continua a haver falta de mão de obra especializada, desde o electricista ao canalizador – sem se perceber porquê porque os preços praticados levam ao caos o orçamento mensal de quem a eles tenha de recorrer, tal como escasseiam os trabalhadores rurais que abandonam os campos, apesar de a jorna não ser assim tão desprezíveis.
Nas cidades, intrigam-nos pessoas precocemente reformadas, com pensões insuficientes, que desistiram de concorrer no mercado de trabalho e que quase vegetam, inactivos, à espera que a vida lhes passe por cima.
O pessimismo nacional, a renúncia a procurar formas de vida mais satisfatórias, é uma maleita que se apoderou da sociedade portuguesa, e que ameaçada tornar-se epidémica e endémica, nos grandes centros, nos campos e nas aldeias.
Num passado recente, o fenómeno de uma falsa e artificial abastança, caída do céu da Europa, provocou um repentino e amplo alargamento das classes médias – hoje, transformado numa nova classe de pobres, o que explica este cair de braços e perda de aprumo.
Por último, correndo o risco de o pessimismo se tornar um congénere desse outro sentimento tão único e português, que é a saudade, e de se profissionalizar, há os que já só vêm tudo a negro, por regra, e que penhoraram as suas vidas e até a vida do País, em público, provocando a aceitação de um sentimento de desgraça generalizado, desde o que se ouve nos noticiários – autênticas novelas da desgraça alheia – à comunicação social escrita, onde rareia a crítica construtiva e tudo está dado como perdido por causa do deficit crescente e da dívida pública em crescendo.
Ao limite de ser dado como inevitável o futuro do nosso País – e, provavelmente só porque a situação da vizinha Espanha não é famosa – é que não se defende a agregação ibérica, de se ponderar o seu desaparecimento, como Estado, a par da queda do euro, que também provocaria uma outra queda: a da Europa.
E o pior é que estes corvos negros da desgraça pensam sobre tudo, dizem mal de tudo, criticam os não pessimistas como se fôssemos opiáceos, sem sequer ter a decência de se sentirem obrigados a fornecer cenários alternativos para ultrapassar a crise que nos afecta – a que já se habituaram e até lhes parece dar uma inusitada confortabilidade - e os males que não se enfadam de nos anunciar como cavaleiros apocalípticos.
Como diria Almada Negreiros, raios partam os Dantas – que tantos os há como havia outrora – porque – arre! – já não há quem os aguente!
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