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domingo, 30 de maio de 2010

O centrão e os idiotas úteis

A propósito da redução do número de deputados

Talvez muitos dos que reivindicam, em tom vociferante, a redução do número de deputados desconheçam que em 1991 foi reduzido o número de deputados de 250 para 230. Os efeitos foram significativos: a proporcionalidade da composição da Assembleia foi automaticamente reduzida; acentuou-se o peso relativo do PS e do PSD; o PCP, que era na altura o terceiro partido (não existindo o BE e estando o CDS reduzido a uma expressão residual) viu reduzida a metade a sua expressão parlamentar. Claro que essa redução se deveu a uma quebra eleitoral significativa, mas o que quero acentuar é que, mesmo que essa quebra não se tivesse verificado, o PCP teria perdido “na secretaria” os seus deputados por Braga, Coimbra, Faro e Leiria. Bem se vê pois que essa ideia de reduzir o número de deputados é tudo menos inocente.

Vendo o que por aí se diz e escreve, tendo a dividir os defensores da redução do número de deputados em três grupos:

Primeiro, os defensores do Bloco Central e da alternância sem alternativa entre o PS e o PSD. Esses sabem muito bem quais os efeitos da redução do número de deputados e encaram a redução como uma forma ardilosa de obter um seguro de vida para o centrão. O PS e o PSD assegurariam a hegemonia da Assembleia da República e os demais partidos ficariam limitados a uma expressão residual, com fracas possibilidades de influenciar soluções governativas. Estão entre esses, várias personalidades do PS e do PSD que defendem publicamente a redução do número de deputados.

Segundo os salazarentos. Estes são aqueles que nunca se conformaram com a democracia e que fazem eco da concepção de Salazar que, em célebre entrevista a António Ferro, afirmava que para parlamento lhe bastava o Conselho de Ministros. Para esses, qualquer deputado é um deputado a mais e atacam o parlamento em todas as circunstâncias. A razão desse ataque é que o parlamento, enquanto expressão da representatividade democrática do país, é o único órgão de soberania onde a oposição encontra espaço de intervenção institucional. Por isso, o ataque salazarento ao parlamento é acima de tudo um ataque à oposição e à democracia. Entre estes, estão algumas vozes próximas do poder económico e que encontram eco numa comunicação social cada vez mais rendida ao populismo.

Terceiro, os idiotas úteis do centrão. Entre estes, estão aqueles que, influenciados pelo discurso enganador dos dois grupos anteriores, e não necessariamente mal intencionados, estão convencidos que reduzir o número de deputados seria uma medida de poupança e uma forma de punir os responsáveis pela má governação do país, roubando o lugar a uma mão-cheia deles. Não estão a ver que aqueles que pretendem punir seriam precisamente os grandes beneficiários da medida que propõem e que em vez de lesar quem exerce o poder a redução do número de deputados lesaria precisamente quem pretende fazer oposição e contribuir para uma alternativa. Não estão a ver que, para o PS e o PSD, não interessa ter muitos deputados: o que lhes interessa é ter o número suficiente para controlar o Parlamento. É por isso que muitos dos que andam para aí em petições a defender a redução do número de deputados estão afinal a contribuir para levar a água ao moinho daqueles que pensam estar a combater. Não passam por isso de idiotas úteis. Úteis ao PS e ao PSD e idiotas quanto à defesa dos reais interesses do povo e do país.
Por: António Filipe, Deputado do PCP na Assembleia da República

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