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domingo, 14 de outubro de 2012

SOCIEDADE: Sem vergonha nem esperança


Anabela Melão
"Para António José Seguro, a subida de impostos é uma "bomba atómica fiscal". Para o PCP, é um "maremoto fiscal". Para Bagão Félix, trata-se de um "terramoto fiscal". Para Francisco Louçã, a coisa atinge o "bombardeamento fiscal". Um antigo secretário de Estado de António Guterres refere-se ao "massacre fiscal". E pelo menos um comentador usou um estrangeirismo em voga e falou em "tsunami fiscal". Se alguém quiser continuar a comparar as mudanças no IRS a calamidades, naturais ou não, lembro que ainda estão livres os termos "ciclone fiscal", "raide fiscal", "furacão fiscal", "pandemia fiscal" e "chacina fiscal"."
" O Governo entrou em funções cheio de ideais nobres e dedicado a tarefas urgentes: ameaça sair de funções sem aplicar um único dos primeiros e resolver qualquer das segundas. Desde o início que o séquito do dr. Passos Coelho é, essencialmente, uma máquina de transigir ou, se preferir
em, um especialista em cedências. O estilo ficou logo demonstrado na novela das autarquias e continuou a desfilar em novelas diversas, de que a da RTP e a das fundações são pequenos, e por isso mesmo reveladores, exemplos: um Governo em teoria eleito para reformar o Estado é na prática incapaz de realizar uma singela reforma digna do nome.
É sabido que, por cá, cada ensaio de reforma desenterra um lóbi empenhado em sabotá-lo, e um estadista decidido a abandoná-lo. A ingenuidade, e uma ingenuidade terminal, levou uns tantos a acreditar que desta vez seria diferente. Não foi. O Governo cedeu com galhardia em todas as tentativas de diminuir a despesa. Em abono da coerência, convém notar que o Governo também cede em múltiplas tentativas de aumentar a receita, logo que estas produzam suficiente contestação nas ruas.
Devoto do método de navegação à vista - à vista do protesto seguinte, que o convence a inverter a marcha -, o Governo só não cede perante o vago grupo de interesses a que se chama contribuintes. São pouco organizados, pouco barulhentos e, apesar das aparências, são de facto poucos. Quinze por cento dos contribuintes pagam 85% do IRS, ou 9% pagam 70%. E pagam calados até ao dia em que, sempre em silêncio, por isto ou por aquilo, deixarão de pagar: os impostos, a crise, uma classe política sem vergonha e um país sem esperança."
Escrito por: Alberto Gonçalves

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