.

.

.

.

domingo, 13 de outubro de 2013

SAÚDE: “Sr. Dr. Eu não tenho direito a estar doente...”

Por: Antonieta Dias (*)
(Uma realidade a curto prazo se não forem tomadas as devidas providências)

 “Sr. Dr. sou o António, aquele doente que trabalha de sol a sol, como agricultor, que foi reformado aos sessenta e dois anos, por invalidez, que padece de várias doenças crónicas, que tem diabetes, hipertensão, colesterol aumentado, excesso de peso, bronquite crónica, artroses e que reside perto daquela zona turística, onde também tem umas Termas muito conhecidas.
Sabe Sr. Dr. eu estou passando por muitas privações, tenho que cultivar as minhas terras, para me alimentar, e queria vender alguns dos meus produtos hortícolas, mas não é possível, pois, para cultivar um quilo de batatas eu gasto um euro, e quando vou vender pagam-me a 50 cêntimos, tenho muito prejuízo...
Como sou proprietário, tenho que pagar os impostos ao Estado, mas eu entendo, pois os nossos Governantes, têm muitas preocupações,  a dívida de Portugal é muito elevada, cada vez é maior  e  somos nós os mais carentes que temos de a pagar... , e vai ser muito mau para conseguirem gerir divida, por isso é que estão sempre a nomear pessoas para ver se conseguem equilibrar as nossas finanças
Eu sei que estamos a viver um período muito difícil para a Nação, e os jovens têm que emigrar para poder ganhar para viver e os que estão no ativo agora já não vão ter reforma, por isso é que me estão a retirar aos poucos a minha.
É por isso Sr. Dr. agora que eu tenho entregar a minha “reforminha”, para aliviar a divida de Portugal, mas eu entendo é preciso tirar a quem pagou honestamente os seus impostos, a quem descontou com muito sacrifício para poder ter uma pensão de invalidez quando não pudesse trabalhar e agora até isso temos que dar, mas assim Portugal fica na história com um grande País.
Sabe Sr. Dr. eu até estou a passar fome, pois o dinheiro vai todo para o Estado, já não chega para pagar os impostos, a contribuição autárquica que cada vez é mais elevada, e eu acho até que vou ter que vendar as minhas “terrinhas” e a minha “casinha “, para poder ajudar a pagar as despesas que o Pais mantém.
É preciso sustentar a dignidade de quem nos representa e por isso temos que pagar as despesas que fazem desde a segurança pessoal até aos telemóveis e para isso é preciso investir muito dinheiro se não o nosso País fica mal visto.
Não importa que eu fique sem nada, o que é preciso e dar a que nos “governa”, por isso enquanto  houver dinheiro nos bolsos dos portugueses mais pobres é preciso vir busca-lo, pois assim ficamos endividados também e trabalhamos para  ter pobreza e percebe-se melhor a questão da nossa dívida.
Os nossos governantes sofrem muito e têm vergonha da divida do País, assim nós temos de dar tudo até esgotarmos os nossos bens.
 Veja lá Sr. Dr. que para Portugal não ficar mal visto na Europa, e mostrar que estamos abastados, continuamos a comprar carros e a ter muitas despesas publicas e como não há dinheiro tenho que ajudar com os meus trezentos Euros…
Mas eu também sou um ser humano, que sofre muito, que precisa de se alimentar, pagar a agua e a luz, os impostos e  da ajuda de um médico, mas não o tenho.
O Sr. Dr. foi-se embora, para integrar uma Unidade de Saúde Familiar, foi viver para a cidade e eu fiquei sem médico.
Eu percebo, é  muito melhor estar na cidade e para além disso, ainda teve outros incentivos, foi trabalhar com os colegas que queria, aumentou o seu vencimento com mais 500 Euros, porque é o Coordenador da Unidade e ainda ganham mais por terem internos.
Isso, foi muito bom, pois até pode gerir os seus horários, escolher os doentes, apesar de ter de cumprir os objetivos, os indicadores e atingir as metas.
Eu sei, que esta mudança, foi muito útil, passou a gastar-se mais, mas resulta mesmo...
O Sr. Dr. agora já não faz as viagens até à minha aldeia, e ainda bem, pois se estivesse cá agora ia sofrer muito.
Nós como não tenho dinheiro para pagar a água, só tomo banho três vezes por semana, e como não tenho dinheiro para pagar a luz deito-me muito cedo.
Para além disso, o petrólio está muito caro, não uso os candeeiros, passei a utilizar velas, como antigamente, e depois levanto-me muito cedo para ir trabalhar para o campo...
Eu percebo isto muito bem, pois era um privilégio para os doentes das aldeias terem um médico de família, era bom demais para nós, e então mudaram a organização da prestação dos cuidados de saúde. Não podemos ter tudo...
Agora até pagamos quase tudo nos hospitais para manter o progresso…
Quando o Sr. Dr. foi embora prometeram-me que eu não ficaria abandonado, pois viria outro médico ocupar o seu lugar.
Eu já estou à  espera dele, desde 2006, mas ele ainda não chegou…
Eu sei que quem não vive nas cidades, tem um tratamento médico diferente, e que os que residem nas aldeias para além de terem poucos transportes..., vão ter mesmo que aguardar, não sei bem até quando, talvez até morrer…
Mas, eu até entendo, que tem que se poupar, e eu poupo mesmo muito. Alimento-me com pouca comida, pois o dinheiro não dá para mais.
Nas minhas seis doenças eu simplifiquei o tratamento, devido às minhas dificuldades económicas, pois os medicamentos são muito caros e eu não tenho dinheiro que chegue para os comprar.
Assim, trato cada uma das minhas doenças, apenas durante dois meses por ano.
Como são só seis foi muito fácil dividir pelos doze meses do ano.
Eu sou um bom cidadão, porque poupo muito ao Estado, e ainda ajudo os farmacêuticos, pois o Estado não precisa de lhes pagar a comparticipação que eu teria, se comprasse os medicamentos todos, que embora seja pequena, representa muito dinheiro, e assim não aumenta tanto a dívida às farmácias e os farmacêuticos também ficam a ganhar, pois como faturam menos, pagam menos impostos.
Como vê Sr. Dr. ganhamos todos com estas medidas.
Sabe Sr. Dr. eu até já pensei ir viver para a cidade, que fica a trinta quilómetros, do local onde resido, para poder ter assistência no hospital, mas já ouvi dizer que também é difícil ser doente lá, pois fica-se muito tempo à espera e também se paga muito.
Contaram-me que na semana passada, um doente que tinha 51 anos de idade, esteve lá 10 horas à espera, para ser atendido.
Tinha uma pulseira verde, porque estava com dores de estômago, mas afinal, quando foi observado tinha um enfarte, mas como já tinham passado muitas horas, o hospital poupou muito dinheiro, pois já não precisou de fazer aqueles tratamentos muito caros, que são necessários fazer nas primeiras horas, e como o enfarte se complicou, o doente acabou por morrer. Foi uma sorte. Assim até o Estado poupou muito mais, já que não tem que lhe pagar o seu salário...
Sabe Sr. Dr. eu acho que a situação do País é tão grave, que nós temos que ajudar, e não devemos viver tantos anos, pois ainda agravamos mais a economia.
Os jovens, continuam a emigrar e nós já só gastamos, se morrermos mais cedo é uma grande ajuda para Portugal, e eu sou Patriota, consigo perceber isto tudo.
Bom, Sr. Dr. já  falei demais, vou ficar a aguardar, para ver o que acontece.”
(*) Doutorada em medicina

Sem comentários: