Negociar com Passos Coelho requer precauções, estudá-lo, apreciar as suas características, o rumo que pretende tomar, o terreno que pisa. Não convém tomá-lo com ligeireza nem subestimar o último golpe no fim do combate. Não é um chefe que esteja sempre à frente das tropas, mas sabe surgir para decidir a contenda. Creio que dentro do PSD é melhor conhecido do que fora, exactamente por essa faculdade de avançar no meio da troupe. Portugal só agora o começa a descobrir. E os outros parceiros políticos também. Incluindo o parceiro de coligação.
Passos Coelho teve a sorte de suceder a José Sócrates, inteiriço e autoritário sem mediações. Não que Passos o não seja, mas cuida melhor do disfarce, embora queira revirar o país do avesso. No sentido errado, claro. De roldão esmaga as pessoas com sacrifícios. Como dizia o outro sobre a ascensão dolorosa de um calvário: "No cimo podem morrer os homens, mas redimem-se as pátrias!" Ou nem uma coisa nem outra…
Passos é determinado. Na oposição teve a arte de, abstendo-se, cavar um fosso com o governo minoritário do PS, que necessitava funcionalmente dessa abstenção, e manteve esse governo em lume brando até o queimar de um golpe numa só labareda parlamentar. Quando foi nomeado primeiro-ministro não estava minimamente preparado para governar. Desconfio que Cavaco Silva pensa o mesmo. Não estava preparado para governar (daí os sucessivos programas e declarações ensaísticas), mas trazia o plano de desfazer os equilíbrios sociais e políticos em que a sociedade portuguesa assentara após a instauração do regime democrático e da adesão de Portugal à UE.
Antes deixou que fosse o governo minoritário do PS a negociar com a troika o ‘Memorando de Entendimento’, embora soubesse que esse governo já não estaria nas melhores condições de defender os interesses do país. Sem mapa minucioso para governar, adoptou na íntegra o guião que lhe puseram em cima da mesa ao chegar a São Bento, conjuntamente com um ministro das Finanças atípico mas formatado para a circunstância. Quando chegou o Orçamento, Passos Coelho já estava rodado na técnica da não-negociação. O PS foi mais uma vez a vítima. Os próximos episódios envolvem o PR e a coisa promete.
Por:Medeiros Ferreira (In Correio da Manhã)
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