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domingo, 31 de julho de 2011

ZEGALHA E ACÍDIA: PECADOS CADA VEZ MAIS PORTUGUESES

Por: Anabela Melão
 A zegalha e a acídia têm algo em comum. Podemos quase entendê-las como qualidades muito à portuguesa. Como "saudade" também podiam estar entre o património único, falado e sentido, dos portugueses. O Paulo Pinto veio esta semana dizer que "o atormentou durante anos a fio, a maldita. A zegalha; uma espécie de virose pandémica que ataca o comum dos mortais, com especial incidência nos portugueses, e que durante muito tempo causou-me incómodos, ansiedade, dores de cabeça ocasionais e dinheiro desperdiçado. Sou um sortudo, vá lá, porque é um mal que pode causar a morte, própria ou alheia ou, em certos casos, lesões físicas e psicológicas profundas. A zegalha é uma doença crónica, misto de panca, estupidez, maria-vai-com-todos, ego inflamado e bravata. Uma mistura explosiva." O que me lembrou um artigo publicado há tempos aqui neste blog sobre a acídia. A tal indiferença, abatimento, torpor, depressão. O atual Catecismo da Igreja Católica apresenta como pecados ou vícios capitais: soberba, a avareza, inveja, ira, impureza, gula e preguiça ou acídia. Embora não perceba bem porque é que a preguiça aparece metida nisto, apesar de reconhecer que a acídia nos começa a entorpecer. São Tomás lá foi dizendo que a tristeza e a acídia não resultam de uma motivação exterior. É assim como que um mal que aflige especialmente os solitários, a par dos tristes. Coisa muito portuguesa, portanto, já que não existem razões para grandes contentamentos. Estranha-se que a Igreja Católica classifique a tristeza como um considerada pecado capital. São Gregório Magno, igualmente, enumerava a tristeza entre os pecados capitais. Dela provém o desespero, a timidez, o torpor, o rancor, a malícia e a divagação da mente. Já a classificaçao de Isidoro dos efeitos da acídia e da tristeza, com base no que observou em Gregório Magno é a seguinte: A amargura provém da tristeza, advém do rancor. A ociosidade e a sonolência reduzem-se ao torpor perante o sacro dever de procurar a felicidade. Os outros casos incidem na divagação da mente é "importunitas mentis", abandonam a torre do espírito e perdem-se na inconstância; no que respeita ao conhecimento, é a "curiositas"; ao falar, "verbositas"; ao corpo "inquietudo corporis"; ao peregrinar de lugar em lugar, sem sentir algum deles como "o seu lugar" é a "instabilitas", instabilidade de objectivos, de desígnios, por desapego aos que o podem desenraizar da sua confortável tristeza e mergulhar nessa desabrida aventura humanamente arriscada, iracional e ilógica, que é a felicidade. Vejo por aqui muita gente - incluindo-me entre eles de cada vez que recebo uma carta das Finanças - que cultiva um sentimento de direito à reivindicação da acídia. E estamos cheios de razão por muitas razões. Depois da avalanche de misérias, a começar pelo saque direito e directo aos nossos bolsos com o imposto "extraordinário", qualificação que decorre da forma "extra" como devassam a nossa bolsa - que nos põe completamente em baixo e nos convida a "produzir" e não a "trabalhar", sendo que a separação entre ambos os conceitos, no caso, é a de "rendimento declarado"! - é certo que nos tornámos todos, variando a graduação, vítimas desta acídia. O que significa que andamos todos "em pecado". E ainda por cima: capital! O que ainda parece mais estranho, já que provém sobretudo do facto de nos "descapitalizarem"! Assim como assim, lembra Drummond: "Cidadezinha qualquer Casas entre bananeiras mulheres entre laranjeiras pomar amor cantar. Um homem vai devagar. Um cachorro vai devagar. Um burro vai devagar. Devagar... as janelas olham. Eta vida besta, meu Deus." Tudo em pecado capital este santo povo, e logo nós que sempre fomos tão catolicozinhos.
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