Que Governo vamos ter?
As contas para um futuro Governo estão bastante complicadas. Vejamos serenamente as hipóteses possíveis.
Cenário 1. O PSD ganha as eleições e tem maioria com o CDS.
Neste caso, não há dúvidas: haverá um Governo PSD-CDS, com ou sem independentes. E poderá haver ou não um acordo parlamentar com o PS para a revisão constitucional.
Cenário 2. O PSD ganha as eleições, mas não tem maioria com o CDS.
Neste caso, o PS vai ter de entrar na coligação. Não haverá, no entanto, um ‘bloco central’, hipótese já taxativamente afastada por Passos Coelho.
Assim, a única possibilidade será um Governo PSD--PS-CDS, chefiado por Passos Coelho (ou outro social-democrata), mas sem José Sócrates. O CDS terá nesta coligação um papel de fiel da balança.
Cenário 3. O PS ganha as eleições e tem maioria com o CDS (e PSD e CDS juntos não são maioritários).
Estando uma coligação PS--CDS fora do campo das hipóteses, porque Paulo Portas também já afirmou categoricamente que não fará Governo com os socialistas, voltamos ao cenário anterior, ou seja, um Governo tripartido PS-PSD-CDS, mas agora chefiado por Sócrates, e sem Passos Coelho e Portas.
Cenário 4. O PS ganha as eleições, mas o PSD e o CDS têm a maioria.
Este cenário é o mais complicado.
E duas hipóteses podem dar-se: ou o PS faz uma aliança à esquerda com o PCP ou com o BE (ou com os dois juntos) e consegue a maioria, ou terão de ser o PSD e o CDS a formar Governo, ficando o PS de fora.
Embora esta solução nunca tenha sido experimentada em Portugal, é comum na Europa, quando o partido mais votado nas eleições não consegue acordos para uma maioria parlamentar, mas outros partidos conseguem.
Aliás, quanto a este último ponto, a Constituição diz que o Presidente da República desenvolverá contactos para a formação do Governo «tendo em conta os resultados eleitorais», nunca afirmando ter de ser o partido mais votado a formar o Executivo.
De acordo com as ‘condições’ impostas por Cavaco Silva, ou seja, a exigência de um Governo assente numa maioria parlamentar, o Presidente da República empossará naturalmente quem lhe apresente uma solução governativa apoiada por mais de 115 deputados.
QUANTO aos cenários descritos, os mais prováveis são o 1 e o 4, pelo que o futuro Governo deverá ser uma coligação PSD-CDS.
Haverá, porém, uma diferença muito grande entre ser o PSD ou o PS a ganhar as eleições.
Se for o PSD, o primeiro-ministro será Passos Coelho; se for o PS, o primeiro--ministro terá de ser outro social-democrata, visto que Passos já disse que só chefiará o Governo se o PSD for o partido mais votado.
E Sócrates continuará a dizer que tem a razão do seu lado, que o povo ratificou nas urnas os seus seis anos de Governo, e que portanto tem toda a legitimidade para fazer uma oposição vigorosa.
Há quem entenda que uma coligação PSD-CDS não conseguirá governar, porque a pressão da rua tornar-se-á insuportável.
Não acredito: se isso fosse assim, estaríamos já numa situação pré-revolucionária.
E não estamos nem estaremos.
O problema, muitas vezes, está no medo.
Os governos têm medo da rua – seja por receio de perderem o controlo da situação, seja por perderem votos.
Mas terão de perder esse medo – caso contrário, não haverá mudanças.
TEMOS todos de interiorizar a ideia de que é preciso fazer rupturas – porque, sem elas, não vamos a parte nenhuma.
E que essas rupturas, como não pode deixar de ser, vão provocar contestação, luta social, greves, manifestações.
Há reformas, como a alteração das leis laborais, que causarão gigantescos protestos, como se calcula.
Mas qual é a alternativa: não fazer nada? Ficar tudo na mesma?
Os governos que marcam os povos não são os que cedem às pressões: são os que fazem aquilo que, em consciência, acham que deve ser feito.
Aqueles que não têm medo de governar contra a corrente.
Aqueles que não se deixam condicionar por corporações, sindicatos ou clientelas – e têm a coragem de seguir uma ideia.
O PIOR que poderia agora acontecer a Portugal era um Governo onde estivessem o PS, o PSD e o CDS, porque não seria carne nem peixe, as reformas ficariam bloqueadas, a capacidade de decisão seria mínima, a discórdia seria máxima – e tudo acabaria num mar de desilusões, com os partidos a ficarem ainda mais desacreditados.
Adiante-se que, se o PS entrasse numa coligação deste tipo, estaria sempre com um pé dentro e outro fora do Governo, procurando capitalizar o descontentamento da rua – o que tornaria a governação ainda mais complicada.
A confusão seria total – e a desresponsabilização seria enorme.
O momento exige clareza.
O próximo Governo deverá ser homogéneo e coerente – até para poder ser responsabilizado.
O pior que nos poderia sair na rifa era um albergue espanhol.
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