Por José João Pais |
Centenário
do 1º Congresso dos Trabalhadores Rurais
Foi em 25 e 26 de Agosto de 1912, fazendo agora precisamente
100 anos, que se realizou em Évora o 1º Congresso dos Trabalhadores Rurais.
Será interessante recordar aqui a contribuição valiosa dada
pelos trabalhadores rurais de Alpiarça na realização desse Congresso e na
consequente formação da Federação Regional dos Trabalhadores Rurais da Região
Sul, da qual a Associação de Trabalhadores Rurais de Alpiarça é sócia
fundadora.
As primeiras greves levadas a cabo pelo operariado agrícola
nos campos de Alpiarça, que tiveram a suportá-las alguma organização, remontam
aos meses de Agosto/Setembro de 1909. Estávamos ainda em plena monarquia e
Alpiarça era então freguesia do concelho de Almeirim. Pode-se dizer que os
resultados palpáveis destas movimentações não foram de grande monta, não só
pelo período político bastante conturbado que então se vivia, estávamos no
período mais quente da chamada propaganda republicana que se vivia com especial
vibração em todo o Ribatejo, como também pela forte possibilidade do regime
cair a todo o momento.
A expectativa para os trabalhadores rurais era a melhor. Os
Republicanos apresentavam-se como os salvadores da nação em ruínas e prometiam
melhores dias para todos. O fim de todos os sacrifícios e da miséria estava,
aparentemente, muito próximo. A palavra de ordem era aguardar e unir esforços
para terminar de vez com a monarquia.
Apesar deste estado de espírito, as movimentações que os
trabalhadores rurais realizaram em 1909 tiveram o mérito de unir toda a classe
e de os fazer acreditar que era possível obter resultados positivos se
estivessem reunidas algumas condições essenciais, nomeadamente em termos de
organização e mobilização.
Poucos dias após o advento da República surgem novos focos
de insatisfação, que culminam, em Janeiro de 1911, com a marcação de mais uma
greve em Alpiarça. Esta paralisação teve, segundo documento epistolar da época
que tive oportunidade de ler, “um
carácter desordenado e arruaceiro. Não houve, felizmente, vexames a pessoas,
apenas alguns gritos de morra! e abaixo! perturbaram a paz desta terra”.
Lideraram esta luta política Florêncio Agostinho e Joaquim
Geada que organizaram grupos de trabalhadores para irem pelas propriedades a
mobilizar aqueles que ainda não tinham aderido ao protesto. Foi de curta
duração esta greve, pois faltou organização na sua elaboração e porque os lavradores
exerceram forte coação sobre os trabalhadores, intimando-os a comparecer ao
trabalho, sob pena de não lhes pagarem, ou de os despedirem. Sabendo-se como
era frágil a condição económica da classe rural, fácil é perceber para que lado
pendeu a balança nesta altura. Estávamos já em plena República e parece que
nada mudara, pelo menos em benefício dos mais carenciados, como tanto se
apregoara nos comícios do Partido Republicano antes de 1910.
No seio dos trabalhadores rurais consolidou-se então definitivamente
a ideia de que era urgente organizar politicamente a classe.
É com essa ideia a fervilhar na cabeça, que os trabalhadores
rurais de Alpiarça formam, em fins de 1911, a Associação dos Trabalhadores
Rurais de Alpiarça, cujo alvará seria assinado no dia 2 de Abril de 1912 pelo
1º Presidente da República Portuguesa, Dr. Manuel Arriaga e pelo Ministro do
Fomento, Dr. José Estevão de Vasconcelos. Fez, pois, em Abril passado, 100 anos
que foi formada a Associação de Alpiarça. Facto que passou completamente
despercebido. O original deste documento histórico encontra-se nos arquivos da
Câmara Municipal de Alpiarça.
A Associação inicia as suas funções de uma forma muito
activa procurando, desde logo, inserir-se noutras organizações regionais do
mesmo tipo. Assim, passados seis meses após a sua formação, estará presente
através do seu Presidente José Cebola, no 1º Congresso dos Trabalhadores Rurais
da Região Sul, que se realiza em Évora nos dias 25 e 26 de Agosto de 1912. Faz
agora precisamente 100 anos que tal aconteceu, facto que vai ser assinalado
nesta cidade alentejana. Apresentaram-se para discussão dos seus problemas 39
sindicatos.
O principal resultado prático deste Congresso foi a
constituição da Federação Regional dos Trabalhadores Rurais da Região Sul, da
qual a Associação de Alpiarça é sócia fundadora. Os seus objectivos eram,
segundo dizia o nº 1 do artigo 3 dos estatutos, “procurar impedir a baixa de salários e melhorá-los, bem assim diminuir
e unificar as horas de trabalho”.
As primeiras direções da associação estão cientes de que o
seu poder de intervenção será tanto maior quantos mais sócios conseguirem
captar. A tarefa prioritária é, então, promover encontros de trabalhadores, não
só em Alpiarça, como nas terras vizinhas, de modo a mobilizar toda a classe e
ampliar o número de associados.
É dentro deste espírito e dos objectivos definidos pelo
Congresso de Évora, que a Associação leva a efeito em Alpiarça, no dia 23 de
Setembro de 1912, uma grande sessão de propaganda para difundir as suas ideias,
objectivos e as vantagens que advinham para todos os trabalhadores rurais da
sua adesão como sócios.
Foi neste contexto, sobre a necessidade de todos se
sindicalizarem, que falou Manuel Afonso, delegado da comissão executiva, bem
como Luís Miranda e José Cebola, respectivamente Vice-presidente e Presidente
da Associação alpiarcense.
Como delegado permanente de Alpiarça junto da Federação
Regional é nomeado Tiago José Varela.
Segundo Alexandre Vieira, no seu livro “História do
Sindicalismo em Portugal”, Tiago José Varela, juntamente com outros
trabalhadores e operários de várias regiões do país, nomeadamente Carlos Rates,
Vital José e Joaquim José Candieira, “foram
os grandes organizadores, em 1912, de muitas associações sindicais, tendo
percorrido grande parte do país formando dezenas de sindicatos, em muitos casos
eram eles próprios que elaboravam os estatutos, montavam a escrita e elaboravam
manifestos”.
Iremos nos próximos capítulos falar sobre as greves e
prisões em Alpiarça, em Setembro de 1912 e depois na ajuda que os rurais de
Alpiarça deram aos trabalhadores de Vale de Cavalos para formarem a sua
associação, o que viria a acontecer em Dezembro de 1912.
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