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quarta-feira, 1 de junho de 2011

Animar o circo e cortar no pão

Há os que trepam às árvores para resgatar cerejas, há os que bebem vinho carrascão e comem febras com o povo, há os que dançam com idosas vitaminadas ao som de orquestrações etnográficas, há os que põem batas e chapéus ridículos para se inteirarem das especificidades do país produtivo e há os que colam nos rostos infantis beijinhos fugidios com a mesma empatia com que se dirigem a uma multidão doutrinada a nacos de lombo.
Conscientemente - e isso é que é dramático -, a classe política portuguesa partiu para esta campanha com o mesmo espírito de outros anos, anos gordos de finanças, em que as dúvidas que nos assaltavam oscilavam entre investir os milhões de Bruxelas em formação profissional ou auto-estradas. O país mudou, mas para eles está na mesma.
Já nem falo da excessiva obsessão dos líderes partidários com a fasquia eleitoral (na verdade, aqui reside o cerne da sua missão: ter mais votos do que o adversário), mas da inadaptação das campanhas ao país que os rodeia. Não deixa de ser curioso que eles se arvorem em modernaços, usando (e bem) as redes sociais para fazer passar a mensagem, mas depois reduzam a sua estratégia a expedientes passadistas, como comícios onde só vai gente a quem é oferecida alguma coisa ou que depende, directa ou indirectamente, do partido em causa; arruadas estéreis para as televisões e banhos de gente que, à míngua de argumentário político, são exibidos como prova de força. As bandeiras substituem as ideias.
Durante duas semanas, a crise entrou em modo "pause". Já ninguém fala da troika, do FMI, de um pedido de resgate financeiro que esganou a classe média. Corrijo: há três dias, o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, na Bolsa de Nova Iorque (??!!), lembrou aos comensais essa coisa chata chamada memorando de entendimento. Um rigoroso plano de obrigações que deambula pelas cabeças dos pagadores de impostos como um cutelo afiado.
Já não é a forma da campanha que me espanta - na verdade, os líderes e os partidos são os mesmos -, mas, sobretudo, a irresponsabilidade com que se promove o circo num momento em que Portugal se debate com um problema de pão
«JN»

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